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Saiba
Responder aos Argumentos Racistas Contra Negros
Lendo uns textos sobre a questão do negro no Brasil,
acabei caindo na besteira de ler os comentários feitos pelos leitores. A raiva
tomou conta de mim (rs) e para não ficar debatendo com gente besta no meu dia,
resolvi escrever no word para liberar meus sentimentos de revolta. É informal,
ficou gigante, ninguém vai ler, mas fica minha contribuição enquanto mulher
negra inconformada neste dia 20.
“A questão é social, e não racial.”
Não, a questão é social e racial, pois após o fim da
escravidão não houve nenhuma política trabalhista e educacional que incluísse
os negros. Ao contrário, estimularam a vinda de imigrantes europeus para Brasil
numa tentativa de embranquecer a população, afinal, um país com tantos negros
jamais iria prosperar. Muitos ex-escravos continuaram trabalhando em troca de
teto e comida por absoluta falta de opção. Posteriormente, foram desalojados
dos cortiços nas áreas centrais, e empurrados para o alto dos morros e regiões
não estratégicas economicamente, o que hoje chamaríamos de subúrbio ou áreas
pobres. Portanto, é uma questão racial sim, pois fizeram isto com um grupo
específico, com uma cor específica. Ou você acha que a maioria dos pobres e
moradores de favela é negra por uma fatalidade?
“Sou contra as cotas raciais, pois não é justo. Para
entrar, tem que ter mérito.”
Imagine que dois grupos farão uma corrida para ver quem
chega primeiro. Sendo que o grupo 1 sairá alguns minutos a frente do grupo 2.
Se a pessoa que ganhar for do grupo 1, haverá mérito? Não, ela foi favorecida.
Ao longo da história, os brancos são o grupo 1 e os negros são o grupo 2. As
cotas tentam minimizar esta diferença histórica, dando ao grupo 2 a mesma chance de vitória que
o 1, considerando que eles estão começando em desvantagem. Assim,
o primeiro colocado do grupo 2 na corrida, mesmo chegando depois de vários
membros do grupo 1 também será considerado vencedor, pois obteve êxito dentro
das condições objetivas que estavam postas.
“Meu primo é pobre, negro e se formou em Medicina. Quem se
esforça, consegue, não precisa de cota!”
Parabéns pra ele! Voltando ao exemplo da corrida: é
possível que alguém do grupo 2, mesmo iniciando a corrida minutos depois, passe
a frente de alguém do grupo 1? É. Agora, parece mais justo exigir que todos do
grupo 2 façam um esforço muito maior para alcançar o grupo que saiu primeiro,
ou não seria melhor, dar possibilidades semelhantes aos dois grupos
considerando o ponto de partida?
“A cota compromete a qualidade dos alunos da
Universidade.”
Pesquisas já provaram que os alunos cotistas conseguem
recuperar a defasagem da trajetória educacional, alguns têm um desenvolvimento
até superior aos não cotistas. Além disto, o fato de existir cotas não quer
dizer que semianalfabetos entrarão, continuará havendo uma nota de corte mínima
para possibilidade de ingresso, assim como sempre existiu, a diferença é que
será considerado o ponto de partida diferente.
“Sou contra as cotas raciais, pois vai gerar
discriminação.”
Curioso que você só perceba o preconceito diante de uma
ação afirmativa. Ir para seu curso em uma faculdade pública e só ver pessoas
brancas não te remete à discriminação, mas quando uma política se propõe a
colorir a Universidade, você fica preocupado com os negros cotistas que serão
discriminados. Não se preocupe, vamos sobreviver.
“Sou a favor das cotas sociais e não raciais.”
As cotas raciais estão vinculadas ao estudo dos últimos
três anos em colégio público e a renda também. O filho do Lázaro Ramos e da
Taís Araújo não vai concorrer. É importante demarcar que a cota é também
racial, pois a questão de classe é perpassada pela cor da pele, negar isto, é
negar a história.
“E o branco pobre, quem irá defendê-lo?”
As cotas incluem três cortes: estudante de escola
pública, negro/indígena e deficiente, e todos pressupõem análise
socioeconômica, portanto, o branco pobre estará contemplado no primeiro corte.
“Sou a favor do investimento no ensino de base, não das
cotas.”
As pessoas falam isto como se ser a favor de cotas
significasse não pensar em investimentos no ensino fundamental e médio. Uma
coisa não exclui a outra. Mas enquanto esse investimento não vem, fazcomo?
“Esse negócio de escravidão tem tanto tempo, superem o
passado.”
Não superaremos, até porque ainda sofremos os impactos
deste passado nos dias atuais.
“Já foi provado que só existe uma raça. A raça humana!”
Ninguém discorda deste fato, do ponto de vista
biológico somos todos iguais (lindo!). Entretanto, na vida social, ainda temos
muitos exemplos de que negros e brancos têm e tiveram, historicamente, oportunidade
e inserções diferenciadas, e o debate é sobre isto.
“Vocês têm mania de dizer que tudo é preconceito.”
Verdade. O fato de o negro ganhar menos, ser mais
parado pela polícia, ter dificuldade de pegar táxi, ter mais chance de morrer
em decorrência da violência urbana, ser chamado de macaco e preto FDP em
situações de conflito (ou cotidianas) é tudo coisa da nossa cabeça. Deve estar
faltando senso de humor mesmo...
“O próprio negro é mais preconceituoso que o branco.”
Vivemos em uma sociedade preconceituosa, assim como
existem negros discriminando negros, existem mulheres machistas, gays
homofóbicos etc., introjetar o discurso dominante é um problema que tem que ser
debatido, mas não é desculpa para pararmos de discutir as desigualdades entre
brancos e negros no nosso país. E não existe embasamento para afirmar que os
negros são mais preconceituosos, parece pretexto para tirar o foco da questão
central.
“Fui chamado de branco azedo na escola, também sofri
racismo.”
O fato de lutar pela visibilidade da desigualdade
racial existente não quer dizer que desconsideramos os diversos tipos de
preconceito: gordas, pessoas com sardas, baixinhas etc. também são alvo de
piadas, e merecem visibilidade, mas aqui estamos falando de uma relação
discriminatória que perpassa a forma de organização política, econômica e
social do nosso país. É desde o apelido na escola, até oportunidades de
inserção no Ensino Superior, passando por maior probabilidade de morte na
juventude etc., ou seja, afeta todas as esferas da vida social desses sujeitos,
que não por acaso, são negros. Gostaria de saber, Branco Azedo, quantas vezes
você entrou no ônibus e as tias sentadas na frente abraçaram a bolsa e te
olharam com espanto? Quantas vezes duvidaram da sua capacidade intelectual pela
sua aparência? Quantas vezes foi o único revistado de um grupo? Quantas vezes
você entrou numa loja e quase se ofereceu para ir ao estoque diante da
indiferença da vendedora? Quantas vezes foi acompanhado pelo segurança das
Lojas Americanas durante seu percurso pela loja? Pode até ter acontecido uma
vez ou outra naquela fase em que você era fã do Eminem e adotou o gangsta
style, mas pro seu amigo de turma, carinhosamente chamado de Tiziu, isto foi e
é a vida dele.
“Vocês têm autoestima baixa.”
Confesso que ter autoestima elevada é uma luta árdua.
Principalmente, quando aos 5 anos, você chama um amigo para brincar e ele diz
que não brinca com negros. E depois você passa o resto da sua vida consumindo
um padrão de beleza que não é o seu, sendo chamada de cabelo duro, ouvindo que
seu nariz é muito grande e seus lábios grossos demais. É difícil, mas acredito
que muitas pessoas conseguem ultrapassar o drama da fase escolar e construir
uma percepção positiva de sua aparência. Isto não quer dizer que temos que aceitar
piadas com nossos cabelos e com a cor da nossa pele. Justamente por ter
adquirido autoestima elevada chamamos atenção para o preconceito e exigimos
respeito.
“Acho desnecessário este feriado de Zumbi. Se fizessem
o dia do orgulho branco, iam dizer que era preconceito...”
A ideia do feriado tem a ver com uma estratégia para
dar visibilidade a questões de grupos socialmente discriminados. Como o branco,
hétero, de classe alta nunca foi socialmente discriminado, não caberia um
feriado, entendeu? O dia dele já é todo dia, no Brasil, há mais de 500 anos, tá
bom não?
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